quarta-feira, 27 de julho de 2011

Sopa de letrinhas

Sei que já o afirmei, às vezes, surge-me uma profunda necessidade, um desejo ardente de escrever.

Escrever não é tarefa fácil. Alguns dias atrás percebi, ao ler um texto no jornal, que me utilizei de uma fórmula um pouco desgastada na arte de expressar. Senti desgastada por senti-la familiar demais. Um pouco sem graça, diria.

Naquele texto, o autor, ousava um tom melancólico, declarado por ele mesmo, e descrevia sua experiência acerca de um passeio descompromissado pela cidade. Para mim, nada de novo. O texto tinha um gosto de isopor.

Mas, não seria suficientemente insensível para que não o observasse de outro ponto de vista. Se eu misturasse um pouco daquela mesma melancolia, é provável que a leitura me transmitisse a mesma sensação. Creio que falhou em enviar junto ao texto seus condimentos. Não havia comigo nenhuma pitada daquela especiaria no dia em que o li.

Esta experiência fez-me refletir sobre que escrevo e do modo como escrevo. Não quero que meus leitores sintam-se como que mastigassem um pedaço de bucho destemperado.

Li dois livros que me marcaram profundamente. Sucesso de vendas, felizmente emprestados e não comprados. Os dois livros continham o mesmo gosto de talher. Decepcionou-me não a mensagem, mas, como eram travados os diálogos. Aquelas conversinhas lembravam-me uma “tempestade”: sabemos que depois de um relâmpago, ouve-se o trovão.

A surpresa de sua falta gostaria de tê-la experimentado. Esta é a cena: mãos aos ouvidos, cenho franzido, olhos serrados, sem que ouvisse qualquer coisa. Na sequência, perguntaria: que ocorreu com o trovão? E, numa investigação ainda mais acurada subsequente, duvidaria dos meus próprios olhos: fora mesmo um relâmpago? Entretanto, tudo soava previsível, planejado no melhor estilo “apresentação jogral”, ensinado no ensino fundamental.

Aquilo foi um atentado à inteligência e uma crueldade contra a imaginação, pobrezinha. Psicologia pretensiosa na tentativa de melhorar o coração das pessoas. Jograis caem bem mesmo em corais, e ainda, muito bem enlatados, digo, muito bem ensaiados...

Em última análise, quem sabe, esteja sendo rigoroso demais. E se as palavras possuírem mesmo sabor? Esta deve ser a única explicação para tantos sucessos editoriais, uma vez que aceito quiabo, mas não suporto berinjela.

Assim, compreendo o ponto de vista de quem lê e se delicia com o estilo “onde há fumaça há fogo”, primo próximo do estilo “tempestade”, ou quaisquer outros. Afinal, quem pode discutir preferências desta natureza?

Há algumas semanas, encontrei-me angustiado pela sétima arte. Era fim de noite. De repente, as primeiras cenas daquele que fora um grande sucesso de bilheteria, geravam tantos e tamanhos maus sentimentos dentro de mim que me sentia deveras perturbado, tenso e irritado. Alguns o classificam como entretenimento...

Obviamente, sabia tratar-se de uma ficção (dita baseada na realidade), contudo, admito, os diretores e roteiristas estão se tornando cada vez melhores (ou piores), o que requer cada vez mais atenção de minha parte. Resta-me lamentar pelos fabricantes de alicates de unhas. Mas, como aprendi, inventaram o botão liga/desliga, decidi com serenidade, não seria apropriado que aquela película ditasse a maneira como eu acabaria a noite. Foi bom economizar energia, e não me refiro somente à elétrica.

Todavia, não posso culpá-lo (ao filme) tão veementemente, afinal, salas de finos concertos, onde afortunadamente poupam-nos dos palavrões, exercem o mesmo fascínio e efeitos colaterais, amenizados por quebras em movimentos e não por intervalos comerciais. Logo, questão de sensibilidade.

E quando escrever, tomarei este cuidado: enriquecerei de vitaminas a minha receita, pois, caso os temperos não toquem aos paladares, pelo menos, o prato fará muito bem, mesmo que não o saibam.

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segunda-feira, 18 de julho de 2011

Pinceladas

Na manhã daquele domingo vi algo diferente, e tem a ver com pincéis...

Eu vi um pintor que, usava um único pincel numa de suas obras mais sensíveis e delicadas. Tratava-se de uma pintura complexa, repleta de detalhes e rica em nuanças. Ao finalizar a obra, o artista não expressava verdadeiramente seu sentimento, pois, com tantos traços diferentes a desenhar, e utilizando-se do mesmo pincel, era-lhe impossível que conseguisse. O resultado não foi satisfatório.

Em contrapartida, o artista tinha agora a sua disposição inúmeros tipos de pincéis. Pincéis largos, pincéis curtos, chatos e redondos. Para cada necessidade, enriquecia-se a obra pelo pincel cujo traço era o mais adequado e apropriado. O resultado sobrepujou sobremaneira a qualidade da primeira pintura.

No final, entendi que somos como aqueles pincéis. Dependendo do trabalho, alguns pincéis são mais requisitados que outros. Participamos de muitas obras durante a vida e não seremos sempre protagonistas, e nem poderíamos. No entanto, somos iguais em importância e relevância para o alcance da exatidão.

Cada qual tem uma função, um dom, imprescindível e irrevogável que não pode ser substituído por nenhum outro. Portanto, adequabilidade é um conceito que cabe somente ao artista e não ao instrumento.

É pelo traço pretendido que se escolhe o pincel e ele não se ensoberbece, pois, o traço não é a obra, mas, parte dela.

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sexta-feira, 15 de julho de 2011

Vaidade e necessidade

No capítulo 10, Evangelho de São Marcos, a Bíblia narra o encontro de Jesus com uma grande multidão.

Caminhavam todos quando, de repente, Tiago e João preparam um pedido ao Senhor: Mestre, queremos que nos faça o que te pedimos, verso 35.

O tom empregado soa mesmo como uma exigência, ou, uma sugestão no mínimo irrecusável. Jesus deu-lhes a oportunidade para que abrissem seus corações: Que quereis que vos faça?, verso 36.

Naquele instante, Jesus dirigia-lhes a atenção e, creio, capricharam no pedido, que, creio ainda, havia algum tempo acalentavam em seus corações: Concede-nos que na tua glória nos assentemos, um à tua direita, e outro à tua esquerda, verso 37.

A resposta imediata de Jesus foi: Não sabeis o que pedis..., verso 38.

E Jesus continua: ...o assentar-se à minha direita, ou à minha esquerda, não me pertence a mim concedê-lo, mas isso é para aqueles a quem está reservado, verso 40.

Após os esclarecimentos, continuaram seu caminho, quem sabe, um pouco frustrados. Fora como um balde de água fria em suas tão legítimas pretensões.

Adiante, havia um cego chamado Bartimeu que, mendigava junto ao caminho. Ele clamava por encontrar Jesus, ao passo que, a multidão o repreendia.

Tanto gritou o homem que Jesus pediu que o trouxessem. Ao se encontrarem, Jesus dá-lhe a oportunidade para que abrisse seu coração: Que queres que te faça? E o cego lhe disse: Mestre, que eu tenha vista, verso 51.

Naquele instante, Jesus o cura e diz: Vai, a tua fé te salvou. E logo viu, e seguiu a Jesus pelo caminho, verso 52.

Neste texto, Jesus fez a mesma pergunta em duas ocasiões próximas, porém, suas respostas foram distintas.

Finalizando, vejo aquela mesma multidão a desaparecer no horizonte com Jesus. Ao lado dele, um homem agora salvo, saltando de alegria pelo que lhe havia sido concedido. Do outro lado, os dois irmãos, quem sabe, tristes e pesarosos por não haver recebido o que queriam. Ironicamente, Bartimeu enxergava perfeitamente qual era sua verdadeira necessidade, enquanto que, Tiago e João, não. Sua vaidade os cegava.

E quanto a nós?

Escrito em 15/07/2011.

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